Neste final de semana eu fiz uma pequena grande viagem.
Fui com a minha mãe até a cidade de Monte Alegre que fica aqui pertinho, a menos de oitenta quilômetros de Natal. Uma viagem pequena, portanto.
Revi lugares e pessoas que me transportaram à infância. Uma viagem grande, de lembranças e saudades, tornou-se.
A pracinha, a igreja, a feira livre, o mercado, o cemitério, as casinhas antigas, miúdas que teimam em coexistir entres as construções modernas que dão um novo aspecto à cidade laboram como reforço para a minha memoria.
Ali onde agora funciona um órgão da prefeitura, que eu não sei exatamente o que é, era em 1970 o posto de saúde e também era a nossa casa.
A minha era parteira e tomava conta do posto. Eu e a minha irmã tínhamos sete e seis anos e as pessoas nos chamavam de “as meninas do posto”.
Lembro que uma quadra depois da nossa casa havia um grande armazém, hoje é um supermercado, lá funcionava o cinema, uma vez por mês.
Nós duas passávamos o mês inteiro juntando os vidrinhos das injeções que a nossa mãe aplicava, para vendê-los na farmácia e com o dinheiro pagar a entrada do cinema.
Toda cidade estava lá, principalmente a meninada. O armazém as vezes exalava um cheiro de xixi que a gente não sabia ao certo se ele já existia lá ou se eram os meninos aproveitando o escurinho do cinema.
De vez em quando a fita quebrava e as luzes acendiam em meio aos protestos e a conversa que rolava enquanto a gente esperava consertar para retomar o filme.
Na grande tela de lençol branco o foco de luz amarelado projetava aventuras de tirar o fôlego. Muitos gritos e assovios eram ouvidos dentro do cinema. Aventuras do Vellho Oeste, do Zorro, Rim tim tim, Durango Kid, 007 mexiam com a nossa emoção e imaginação.
Quando o filme acaba, eu e a minha irmã nos colocávamos de pé na esquina gritando até a nossa mãe aparecer na porta em sinal de que estávamos sob a segurança do seu olhar.
Mesmo assim a gente ia em disparada, de mãos dadas, não queríamos correr o risco de dar de cara com a assombração que afirmavam existir no curral de vaquejada, por trás da nossa casa. Diziam que se tratavam de um negrinho pelado. O que para mim, na época, tratava-se de um menino careca.
Esse era o maior risco que a gente corria.
Hoje, infelizmente, a cidade está extremamente insegura. São constantes os casos de assaltos e violências praticados por pessoas que vêm de fora, sabendo que o contingente policial é pequeno, desprovido de recursos e condições para garantir a segurança dos moradores.
Assim, fica cada um a mercê da própria sorte.
Felizmente, nem o pior e maior bandido do mundo tem a capacidade de roubar as lembranças.
Assim eu guardo comigo a recordação de uma cidade pacata onde a gente brincava de roda, de tica e outras brincadeiras no meio da rua e nos finais de semana nos juntávamos nos quintais para brincar de cozinhado com panelinhas de barro, comida e fogo de verdade.
Tempo em que as novidades que mais deixavam a cidade em polvorosa era à chegada do circo, do parque ou dos ciganos. Aí era uma nova aventura para mexer com a nossa emoção e imaginação.
Tempo bom, que vale a pena viajar até ele de vez em quando.
14 comentários:
OLÁ IVANA!! NADA COMO RETORNAR AO RECENTE PASSADO DE VIDA PACATA EM PEQUENAS COMUNIDADES DO INTERIOR. INFELISMENTE VC ESTÁ CERTA, NÃO HÁ MAIS ESSES PARAISOS - COM RARAS EXCEÇÕES - E NADA SE PODE FAZER COM ESSA ESCALADA DE VIOLÊNCIA, POIS A TAL DE SEGURANÇA É UMA UTOPIA, APESAR DE ALARDEADA PELAS AUTORIDADES E NAS PEQUENAS CIDADES COM UM EFETIVO TAMBÉM MÍNIMO DE POLICIAIS A COISA CORRE MEIO SOLTA E OS LADRÕES BARATOS PASSAM A FAZER PARTE DA ROTINA. MAS COLOCAS BEM QUE UMA COISA N PODEM ROUBAR, AS LEMBRANÇAS. ISSO É CERTO, MAS PENA QUE NÃO SE PODE MAIS DORMIR COM A JANELA ABERTA, PORQUE PRIMEIRO SÃO OS MOSQUITOS E DEPOIS OS LALAUS. ESSA É A VIDA QUE SEGUE EM FRENTE, INSEGURA MAS VAMOS SE VIRANDO NOS TRINTA NÃO É MESMO? PARABÉNS PELA NARRATIVA E GR ABRAÇO !!!
IVANA É REALMENTE MUITO BOM RELEMBRAR UM PASSADO NEM TÃO DISTANTE MAS TÃODIFERENTE DOS DIAS DE HOJE. AVIOLENCIA NÃO SE FAZIA PRESENTE EM TODOS OS LUGARES COMO ÉHOJE.AS CRIANÇAS PODIAM BRINCAR UMAS COM AS OUTRASE INTERAGIAM OS SEUS ANCEIOS E ALEGRIAS. hOJE TODO MUNDO VIVE SOBRE PRESSÃO PSICOLOGICA,SABENDO QUE A CADA MOMENTO ACONTECE AS MAIS VIOLENTAS TRAGEDIas. Podemos dizer: Tempo bom que não volta mais . Muito bonito o seu texto parabéns um abraço
Que coisa boa Ivana, adorei a narrativa das suas lembranças e como é gratificante ter tido um passado assim.
Beijos
Essa escritora...... hummmm...... vai dá muito o que falar. Gosto muito de ler o que escreves, porque realmente nos faz lembrar de coisas muito em comuns que vivemos na infância. Acho aliás, que a nossa geração quase toda viveu essas experiencias, em lugares pacatos, brincadeiras e diversões sadias,e sem falar que realmente tínhamos mais segurança social. Hoje, corremos perigos até dentro de nossas casas. Mas, enfim, é muito bom relembrarmos os bons tempos, em que éramos muito felizes e não sabíamos. Um bjãoooo no seu coraçãoooooo!!! Dira.
Oi, Ivana
Vim conferir o seu blog. Lhe peço desculpas, pois para mim Vc era uma amiga de minha cidade e como ela não tem blog, nem me toquei q poderia ser outra Ivana Maria. Me perdoe.
A sua visita a cidade Natal, lembra bem a minha história, enquanto moradora de cidade pequena. Morei muitos anos no RJ e qdo retornei tive a mesma sensação.
Belo texto, sincero e cheio de vida!
Um abraço
Natalícia
Adorei... ralmente uma grande viagem às memórias... inclusive as minhas, que apesar de ñ ter conehcido a cidade na mesma época mas também pude desfruta-la qdo ainda era pequena... as férias na casa da vovó, tão bom acho que modernidade nenhuma supera as aventuras de roubar goiaba ou siriguela no vizinho, ver a "queima" de fogos na igrejinha na virada do ano, ir aos "parques de diversões" que eu gastava todo dinheiro que vovó me dava só no balanço... rs! Ai q saudade.. .até eu viajei agora... sem nem sair do lugar....AR
Oi amiga, você me fez voltar a um sítio lá no Piauí, se chama Retiro, era do meu avô e no qual vivi até os 9 anos e dpois fui morar na cidade e ia no período de férias.Fiz isso até os meus 14 anos e foram os melhores anos de minha vida. Também morei numa cidade pequena dessas com uma tv no meio da pracinha com algumas plantas bonitas e flores... Ah! saudade boa...Você tem esse dom de nos fazer felizes até com lembranças às vezes nostálgicas. Parabéns e obrigada por tudo. Um grande bj em seu coração.
É ótimo voltar a esse passado, de coisas boas, inocentes, que mexiam com a imaginação e faziam a gente cada dia mais gente...o texto está belo!!bjs
Oi Vaninha.
Como sempre leio os comentários, e a maioria tem uma história parecida.
Pois é foi uma infância muito boa, nem nos davamos conta do quanto a nossa mãe trabalhava e segurava a barra de ser diquitada, era tantas vezes discriminada e aguentava tudo calada, uma heroina a nossa mãe, louvo a Deus por ter me dado uma mãe como ela, mulher de fibra, e muito carecter, adimiro muito. E adimiro muito tb essa minha irmã, mãe (como 1ª profissão, professora, diretora e grande escritora. Um dia eu vou ver seus livros editados, ou melhor eu vou pra noite de autografos... super chique né??! mas vai acontecer!
Um xero bem grande, amo muito vc!
Olá, Ivana! Li este seu texto e também viajei para o interior que, na verdade, todos são muito parecidos entre si: o cinema, a praça, o circo. Lembranças boas de um tempo que não volta mais. Hoje, temos a violência que assola todos os recantos. É uma pena. Mas, parabéns pelo seu escrito. Continue. Um beijo grande. Joca.
Oi Ivana!
Que texto gostoso de ler! Nostálgico, gosto disso!
Como moro em Natal e tenho um sítio lá perto de Monte Alegre, conheço a cidade e fiquei viajando na sua narrativa, imaginando como era a cidade... Um abraço!
Doces recordações que aquecem a alma. a minha cidade de infância também era pequena, acolhedora e segura, e nossos medos eram irreais, fruto de lendas e histórias que passavam de geração a geração...
beijos
IVANA!! JÁ ESTOU COM CIUMES, TANTOS OS COMENTÁRIOS EM CADA POSTAGEM QUE INSERES NO TEU BLOG...BRINCADEIRA...ESTÁS DE PARABÉNS...SINAL QUE TODOS TÊM APROVADO OS TEXTOS QUE VC ESCOLHE PARA BRINDAR SEUS LEITORES, ENTRE OS QUAIS FAÇO PARTE. GR ABRAÇO E CONTINUE ARRANCANDO DESSE SEU INTERIOR LITERÁRIO AS COISAS BOAS QUE TENS VIVIDO E OUTROS TEMAS QUE ABORDAS COM TANTA PROPRIEDADE.
Monte Alegre, cidade de grandes histórias não é mesmo? Vivemos momentos maravilhosos nesta pequena cidade, podemos dizer que fomos muito felizes. Se pararmos para lembrar, dá pra escrever um livro (aliás, por que você não faz isso?)Pois é minha amiga, foi nesse mesmo posto de saúde que nos conhecemos, ainda lembro bem como tudo aconteceu, meu pai levou-me pra sua mãe me aplicar uma injeção e nós começamos a brincar, eu você e nega, faz bastante tempo não é mesmo. E mais maravilhoso ainda é sabermos que nossa amizade continua até hoje. Um grade abraço, continue contando essas histórias maravilhosas.
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